Existe uma diferença enorme entre a pessoa que vejo no espelho e a pessoa que imagino que sou. Nem para o bem nem para o mal, dificilmente consigo me olhar com honestidade, objetividade. Verdade seja dita, sempre confundo a real imagem com a de personagens que vivem na minha cabeça.
Alguns dias sinto minha pele quase se separando do resto do meu corpo. Como se estivesse deteriorando rapidamente. Minhas costas curvadas, meu queixo baixo. Vejo minhas formas estranhamente deformadas. Uma velhinha muito parecida com a bruxa que entrega a maçã envenenada para a Branca de Neve - um serzinho que sempre me assustou quando era criança.
Quando tenho acessos de fúria sinto como se virasse um ser detestável visualmente. Com uma boca incontrolável. A personificação do descontrole é tão forte que chego a me encolher quando lembro do momento de raiva e me vejo nessa forma odiosa.
Em outros momentos, os de solidão ou de tristeza, tenho a impressão de não ser corpo. De não ser pessoa, de não ser presença, mas sim névoa. Algo branco, enfumaçado, perdido e sem sentido.
Quando amo, sou pequena e terna. O suficiente para me aconchegar e caber nos espaços mornos do corpo do outro. Sou quase criança.
Alguns dias sou velha, outros sou jovem, outros sou indefinida. Nunca a pessoa do espelho.
Pela herança deixada na minha imaginação por filmes, músicas, livros, desenhos, quadros, histórias, acho que o meu cérebro não admite que nenhuma mudança visual aconteça quando vivo extremos. Não se conforma por não conseguir exteriorizar a enorme excitação interna que toma conta de tudo quando algo é marcante em minha vida.
Talvez por isso a palavra seja tão importante. A voz que consegue tirar de dentro todo o lixo, toda a beleza, toda a mediocridade que algumas vezes confundo com profundas conclusões. Nem sempre é possível fazer com que entendam a imagem, mas as palavras tentam tornar real algo que é apenas uma sensação. Eu mesma posso, através delas, perceber a dimensão verdadeira do que sinto. E geralmente o efeito é bem mais suave do que imaginava.
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